domingo, 31 de maio de 2009

Céu Cinza

"Então, então você acha que consegue distinguir
O céu do inferno. Céus azuis da dor"
Pink Floyd

Caelum é o espaço infinito onde se movem os astros e estrelas, cotidianamente conhecido como céu. Pode ser referencia ao céu mitológico, significar a criação do mundo: o firmamento. É o lugar onde as aves voam, de onde a chuva cai, no qual os relâmpagos brilham. É a morada do sol, mesmo quando o sol lá não se encontra. O palco da Lua, o caminho das estrelas, habitado por anjos, a morada de Deus. O sonho humano é explorar os céus.
Para dar a dimensão do céu só o idioma hebraico, para o qual a palavra não possui singular, sugerindo sempre “os céus”, o que dá idéia da amplitude, da imensidão, da pefeição nele contemplada.
Primeiramente, o céu é a tela das cores da natureza; Permeado por todos os comprimentos de ondas de luz, assume a cor azul mediante o olhar do observador. Isso se dá porque quando a luz solar chega na Terra, encontra a atmosfera como obstáculo, e as ondas de diferentes tamanhos ao esbarrar nas moléculas de ar começam a se espalhar de diferentes formas, sendo que as de menor comprimento são as que se espalham com maior facilidade e as mesmas consistem nas de cor azul.
Quando além das moléculas de ar existem outras partículas ou tipos de poeira, as ondas azuis se diluem obtem-se a visualização de outros tons, o mesmo também pode ocorrer no por-do-sol, quando os raios de luz incidem obliquamente sobre a Terra permitindo outras cores: rosa, amarelo, cinza...
A maioria dos indivíduos prefere o céu azul, palavra derivada do árabe e persa “lázúrd”, por “lazaward” que significa “céu sem nuvens”. Os fotógrafos chamam o melhor céu pra fotografar de “céu de brigadeiro”, que consiste em céu azul, sem nuvens, pois a presença de nuvens altera a luminosidade na fotografia. A expressão idiomática “tudo azul” se refere ao céu em paz, a um estado de bem-estar e plenitude. Já na literatura inglesa o ceú que expressa contento é o cor-de-rosa.
De acordo com pesquisas, a cor do céu altera o estado emocional dos indivíduos, e aqueles que moram em lugares de ceú mais escuro ou que ficam sob luz artificial durante longos períodos tem maior propensão a desenvolver quadros depressivos.
O sujeito tende a associar as cores a sentimentos, experiências. A cor cinza é associada ao pó, a neblina, ao mar sob tempestade.
De acordo com a teoria psicológica das cores, o cinza remete a tristeza, ao desânio, a seriedade, ao passado. A palavra deriva do latim “cinicia”, e remete a posição intermediária entre luz e sombras.
O ceú cinza é renegado pela sociedade atual onde a felicidade é lei: ser feliz independente da felicidade dos demais. Uma sociedade na qual deve-se aparentar felicidade para manter as relações sociais se não se está feliz. Além de infeliz, se uma pessoa reclama ainda se torna solitária, porque as pessoas estão ocupadas demais para ver e entender as insufuciências da criatura humana.
As fotos do orkut são de pessoas sorridentes, as cores são muitas, presente na moda, nas roupas. Se alguém usa cor escura, certamente encontrará quem pergunte se pertence algum grupo específico, se é deprimido, e assim os rótulos vão sendo pregados nos seres.
Ora, é obvio que o fim que se busca na existência é ser feliz, mas até para conhecer e reconhecer a felicidade é necessário uma dose de dor, de se conhecer a tristeza. Somente assim é possível estabelecer parâmetros para avaliar a situação, a vivencia, para se definir felicidade.
Uma sociedade que nega a tristeza na vida, nega cemitérios, nega dias cujo céu é acinzentado. Mas o céu cinza permite antes de tudo uma reflexão sobre os valores que são conferidos na relacão homem mundo.
Diante de um céu cinza, a dor encontra lugar pra existir no mundo. A insatisfação que faz o sujeito lutar por dias melhores pode ser representada. Quem sobrevive e até contempla um dia cinza tem humor, ri da tristeza e elabora assim o luto. Quem sobrevive a um dia cinza sabe que os dias cinzas podem desanimar, mas não matar, o que remete a máxima de Nietzsche que menciona: “O que não mata fortalece.” Fortalece porque fica claro que a cor do céu não é tão “vital”, que a jornada continua, mesmo que por inúmeras situações de tristeza talvez parecesse melhor que a existência ali se findasse.
Um dia cinza lembra o Antigo Testamento afinal os textos ali escritos contam com uma carga significativa de “princípio da realidade” e de realidades cruéis que ultrapassam a força humana para vencer ou superar. Realidades e dores mediante as quais só resta ao ser suportar, e, que ironicamente só pode ser suportada com leveza de espiríto de quem aceita a realidade e sabe que mesmo com dor a vida continua. Que conta com uma carga de resignação digna do livro de Jó: “Deus deu, Deus tirou, bendito o nome do Senhor.”
Resignação consiste em saber que os fardos da vida quando carregados, mesmo que não resolvidos, dão um sentido ao trabalho, mesmo quando o trabalho é de Sísifo.
Segundo a mitologia, Sísifo era o mais astuto dos mortais, sua inteligência era uma ofensa aos deuses. Certa vez, viu uma águia sobrevoando sua cidade com uma jovem nas garras, ao reconhecer a jovem Sisifo trocou a informação de onde a mesma estaria por uma fonte de água para o povo. Mas o fato de impor uma condição, irou Zeus que enviou o deus da morte contra Sísifo. Sísifo porém, enganou a morte elogiando a sua beleza e dando-lhe um colar que na verdade era uma coleira e mantendo a morte aprisionada e fugindo do seu destino.
A morte prisioneira, não matava ninguém e o deus dos infernos, se enfureceu aliando-se ao deus da guerra, que estava indignado por não morrer ninguém em batalhas. Os deuses então libertaram a morte, que matou Sísifo cumprindo sua missão.
Não contavam porém, que o mesmo havia pedido para sua mulher não enterrá-lo e logo que chegou ao inferno foi reclamar que não teve enterro e pediu um dia de prazo para se vingar dos que não o enterraram. Pedido concedido, o mesmo retornou a vida e fugiu com sua esposa. Enganando a morte pela segunda vez.
Quando morreu de velhice, foi considerado um grande rebelde e condenado a um castigo eterno, junto a Prometeu. Mas seu castigo consistia em rolar uma grande pedra de mármore com suas mãos até o cume de uma montanha e quando estavivesse quase chegando ao topo, a pedra rolava novamente para baixo.
E, desde então, todo esforço inútil é denominado “trabalho de Sísifo”. Remetendo a idéia de trabalho inútil. Tais idéias e mitos, podem remeter a um niilismo a uma falta de sentido e direção da vida, da existência. A carga de sentido está além, assim como o sentido de um céu cinza que não pode ser reduzido a uma simples cor.
Avaliando segundo Schopenhauer, a existência humana mediante a interpretação universal é insignificante por ser imergida na temporalidade, pois o atual, o momento vigente é um grande nada quando comparado a infinidade que o tempo possui quando avaliado sob o prisma do eterno.
A simples questão da cor do céu pode ser profunda por permitir a existência e expressão da tristeza até no céu, lembra ao humano o seu tamanho diante da imensidão das possibilidades. Faz refletir que jamais o ser saberá se suas ações estão corretas em “absoluto”, se as reações das ações serão benéficas em “absoluto”. Só resta as criaturas saber se o que é feito é feito por amor. Pois, só o amor confere forças as mãos para a realização de trabalhos inúteis, de ações que se perdem no tempo, de lutar contra fatos indissolúveis, de circunstâncias que não se resolvem e podem apenas melhorar. Não há como saber se é bem ou mal, mas a perspectiva interior possibilita saber se as ações são guiadas e embasadas no amor.
E, o que resta é: amar, fazer o que quiser e suportar as consequencias. Só assim pode-se contemplar um céu cinza e sorrir.

domingo, 24 de maio de 2009

Comentário do Filme: GATTACA

"Somos feitos como as estrelas? Somos feitos delas,
por elas, e talvez pudéssemos estudá-las em nós.
Já não somos a medida do mundo,
somos o mundo."
Jean-Claude Carrière

Mais do que uma ficção envolvente e com bela filmagem, GATTACA, o filme que é denominado por uma seqüência de bases nitrogenadas aborda uma ficção que não se encontra longe de ser realidade. Supõe uma época em que os seres são hierarquizados de acordo com o seu potencial genético. Estipula os possíveis preconceitos que passarão a existir quando o ser humano dominar completamente o código genético e conseguir moldar um indivíduo de acordo com a volição, produzindo um sujeito que possui apenas características escolhidas e selecionadas geneticamente.
Inicia contando a história de dois irmãos, o primogênito foi concebido pelo amor de seus pais e com genes aleatórios, segundo o método de reprodução normal. Ainda no momento do parto o pai descobre que o filho possui uma malformação congênita no coração e que viverá até a idade aproximadamente de trinta anos, o que faz com que o progenitor não dê seu nome ao filho. O casal decide acertar com o filho mais jovem e faz uma seleção genética para que o mesmo possa ser vencedor e tenha vida longa e sem doenças.
O filme faz uma crítica atroz ao fato de a sociedade considerar que uma pessoa geneticamente perfeita está isenta de problemas, mostrando o caso de um nadador que após um incidente automobilístico fica paraplégico, apesar de sua genética selecionada. Remete ao fato de que o elemento sempre estará subjugado às interferências do meio ambiente.
Explicita que independente do código genético o ser humano é capaz de amor: de doar e receber. E, que não importa o quão o mundo evolua que valores humanos como a amizade e a admiração podem salvar mesmo aqueles com uma carga genética insuficiente para os padrões sociais.
Durante o início do filme os irmãos competem no mar, e o selecionado geneticamente sempre leva vantagem, no momento de maior carga emotiva do filme, os dois se encontram na vida adulta e voltam a competir no mar aberto, para ver aquele que nadaria maior distância.
Os dois nus no mar fazem uma menção simbólica ao nascimento do ser humano que só tem a si mesmo despido de tudo diante da vida, lançam-se na competição para ver quem chegaria mais longe. Surpreendentemente o geneticamente defeituoso ganha e quando questionado pelo irmão diz que venceu por não guardar forças para voltar.
O sentido da existência só pode ser encontrado quando nos lançamos no mar do mundo em busca de um sonho e de um amor maior, um amor que faz viver por valer a pena morrer por ele. Um amor que faz com que se gaste tempo e todas as forças para alcançá-lo sem guardar forças para voltar, sem sequer pensar em voltar atrás, em olhar para trás. Um amor a que nos entregamos nus e inteiros, com nossas virtudes e insuficiências.
GATTACA permite a reflexão de que não são nossas bases nitrogenadas que conferem valor aos atos humanos, mas sim: a coragem, a volição, o amor. Porque, enquanto muitos julgam que o ser humano é formado por guanina, timina, adenina e citosina o ser humano supera a si mesmo mostrando que os corpos são formados pelos mesmos átomos das estrelas que permitem ao indivíduo lançar seus olhos no oceano e sua alma para o mar vencendo a noite escura sem fim que são as limitações por simplesmente se lembrarem de seus sonhos e de onde desejam ardentemente chegar independente do tamanho da renuncia, do sofrimento ou mesmo do empenho para tal.

FICHA TÉCNICA
Título Original: Gattaca
Gênero: Ficção Científica
Tempo de Duração: 112 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1997
Estúdio: Columbia Pictures Corporation / Jersey FilmsDistribuição: Columbia Pictures / Sony Entertainment Pictures
Direção: Andrew NiccolRoteiro: Andrew Niccol
Produção: Danny DeVito, Michael Shamberg e Stacey Sher
Música: Michael Nyman
Direção de Fotografia: Slavomir Idziak
Desenho de Produção: Jan Roelfs
Direção de Arte: Sarah KnowlesFigurino: Colleen Atwood
Edição: Lisa Zeno Churgin
Efeitos Especiais: Cinesite Hollywood / 3dsite
SINOPSE
Num futuro no qual os seres humanos são criados geneticamente em laboratórios, as pessoas concebidas biologicamente são consideradas "inválidas". Vincent Freeman (Ethan Hawke), um "inválido", consegue um lugar de destaque em corporação, escondendo sua verdadeira origem. Mas um misterioso caso de assassinato pode expôr seu passado.

Arquétipo do Nariz Vermelho

"O animal mais sofredor da Terra inventou o riso."
Friedrich Nietzsche

Já é tradição que o nariz do palhaço é vermelho. Mas para se reafirmar as tradições e entender mais acerca do mundo, tem que se primeiramente questionar o “Por que” de tal tradição. Parafraseando Fernando Pessoa: “Primeiro estranha e depois entranha”.
Quem usa um nariz vermelho e nunca se questionou sobre a existência, a história e o simbolismo do mesmo, tem feito um uso vazio, despido de ciência.
Seria simplista escrever que vermelho pode indicar poder, sendo a cor dos cardeais, ou ainda indicar uma luta, ou a cor que junto com o verde forma a decoração de natal. Pode-se defender que vermelho remete a sangue, e por analogia à vida; ao sangue de Cristo para os religiosos. Isso se dá porque a cor vermelha pode ser associada a inúmeros sentidos: é a cor da paixão para os apaixonados. A cor da alegria para uns e da pureza para outros.
Mediante a tal reflexão é preciso que se aprofunde não só na análise da cor, mas a aspectos profundos, pois o nariz vermelho do palhaço pode ser considerado um arquétipo.
Arquétipo, palavra de origem grega grafada: aρχή – arché, que significa principal ou princípio, remete ao primeiro modelo de alguma coisa. A palavra foi adotada pelo psiquiatra suiço Carl Gustav Jung indicando a forma imaterial à qual os fenômenos psiquicos tendem a se moldar, refere-se aos modelos inatos que são matriz para os fenômenos da psique. Ou seja, são tendências estruturais invisíveis dos símbolos, são representações, imagens que que correspondem a alguns aspectos da situação consciente do sujeito. Possui como sinônimo a expressão “imagens primordiais”. Segundo Jung se originam da constante repetição de uma mesma experiência no decorrer de inúmeras gerações.
O termo refere-se, portanto aos símbolos presentes no inconsciente coletivo. O inconsciente coletivo é a consolidação da experiência ancestral da espécie, sendo formado pelo material psíquico. Uma analogia facilita a compreensão: o inconsciente coletivo é como o ar, que é o mesmo em essência em todo lugar, é respirado por todos e não pertence a ninguém. O conteúdo que forma o inconsciente coletivo são os arquétipos que funcionam como peças do quebra-cabeça que o inconsciente coletivo é.
A personificação da figura mítica seja ela o palhaço ou um herói é algo que acompanha a humanidade e tem um significado que vai além do plano real da existência e consolida o inconsciente coletivo e se insere no tempo e na história. A forma de pensamento universal possui não só a carga estética, mas também uma carga afetiva sobre a imagem, sobre o símbolo.
Assim tratar do nariz vermelho do palhaço implica em evocar todo o significado que o gerou. Associa-se assim a força da forma com a força da cor.
Quanto à forma, o nariz do palhaço, consiste em uma bola redonda, um círculo. O círculo remete ao ponto, muitos palhaços pintam só um ponto vermelho como nariz, e pode ser considerado como sinal supremo de perfeição, união e plenitude. O centro que encontra motivo na própria existência.
O nariz podia ser verde, rosa, laranja. Mas, só de imaginar o nariz de palhaço dessa cor tem-se estranheza, pois se estruturou no inconsciente coletivo que o nariz do palhaço é vermelho.
Na grande maioria das civilizações, em sua simbologia, o vermelho significa força
, virilidade, feminilidade, dinamismo. É uma cor exaltante e até enervante. Impõe-se sem discrição. É uma cor essencialmente quente, transbordante de vida e de agitação.
Na arte e na antropologia, o simbolismo da cor refere-se ao uso da cor como um símbolo em todas as culturas e religiões, enquanto a psicologia da cor remete à análise do efeito da cor no comportamento e sentimento humano, distinta da fototerapia (o uso da luz ultravioleta para curar a icterícia infantil). É importante não confundir psicologia da cor com simbolismo da cor. Mesmo apesar do fato de o simbolismo da cor possuir um caráter psíquico.
O vermelho, do latim
vermillus, é a cor do sangue, situado no limite do visível do espectro luminoso. Abaixo deste comprimento de ondas, o infravermelho, não é mais perceptível pela visão humana. Também é conhecida como escarlate ou encarnado. É cor-luz primária e cor-pigmento secundária, resultante da mistura de amarelo e magenta.
Evoca padrões de memória que se relacionam a cor do coração, ao fogo, ao sol, ao rubi, a lava quente dos vulcões, a revolução.
Analisando a cor vermelha no âmbito do nariz do palhaço por intermédio da setença: " O nariz do palhaço representa os olhos, e os olhos representam a alma." Pode-se concluir que o nariz do palhaço é vermelho para chamar atenção do público por ser uma cor quente.
Serve como indicador da direção na qual o mesmo vira o rosto: o palhaço nunca movimenta o olhar, sempre move a cabeça em direção ao que observa o que por si só já consegue extrair risos.
Assim sendo, os olhos do palhaço tem de ser expressivos, tem que transmitir sentimentos, pois não precisam servir para indicar o que o palhaço olha. Não são portas de saída, mas de entrada, e dá acesso a alma do artista. Estabelece a relação palhaço - público, palhaço – outro. Permite que o sentir seja expresso pela forma e direção do olhar.
Os narizes são vermelhos porque zombam das ditaduras do ontem e do hoje, porque indicam que apesar da dor e sofrimento a vida continua, continua no centro do rosto, continua quente como o sol, continua apontando a direção na qual olhamos para lançar nossas almas nesse misterioso oceano a que chamamos vida.

domingo, 17 de maio de 2009

Promoção de saúde

“la salud se promueve proporcionando condiciones de vida decentes,
buenas condiciones de trabajo, educación, cultura física y descanso”
(Sigerist apud Terris, 1992, p.38)


A expressão “promoção de saúde” foi usada pela primeira vez em 1945 pelo canadense Henry Sigerist.
O médico historiador definiu quatro tarefas essenciais à Medicina:
1- Promoção de saúde.
2- Prevenção de doenças.
3- Tratamento dos doentes.
4- Reabilitação.
No âmbito da graduação médica, muito é discutido no que se refere ao aspectos da Humanização nos setores relacionados ao tratamento dos doentes.
Os projetos como os Doutores da alegria, o Humanizarte visam levar mais cor e descanço aos pacientes. Porém, o serviço de saúde não pode se restringir ao ambiente hospitalar.
A humanização no campo da promoção da saúde é bem mais difícil do que aparenta, uma vez que é negligenciada devido a crença de que em tais serviços existe um atendimento mais próximo e, portanto, mais humano. Pouco se investe em tais medidas.
Desde os primórdios da medicina existe uma grande dicotomia entre a saúde pública e a individual. Expressa no campo mitológico pela alegoria das irmãs: Higéia e Panacéia.
Panacéia é a consolidação da assitência ao indivíduo doente, sendo uma representação do aspecto individual do tratamento. Uma vez que se a doença se instala, o campo de atuação se restringe a cuidar de um indivíduo.
Higéia é a personificação de medidas que visam manter a saúde que se possui e não lutar contra males já intalados. É de difícil efetivação porque é facilmente abandonada, pois o ser humano tende a se lembrar só do que causa problema. As pessoas tendem a se lembrar da saúde apenas nos períodos de doença, quando a mesma falta.
Higéia propõe medidas que não ficam restritas a um indivíduo, mas que está relacionada ao ambiente público, são medidas que vão desde esgoto até lazer, que consistem em agentes fundamentais para a consolidação da saúde em um determinado grupo social.
(visita)
Pensando assim é que se propõe a ampliação das medidas de humanização das práticas médicas objetivando atingir ações que visam a promover da saúde, em reconhecer outros aspectos do ser humano que não somente o corpo. Salientando que o objeto de estudo da medicina é "o outro" e não apenas o corpo ou a doença.
Aliando essa perspectiva ao projeto Humanizarte, um dos mini-grupos do projeto efetuou uma visita ao asilo "Vila Vicentina Nossa Senhora de Aparecida" no dia dezessete de maio de dois mil e nove.
A visita se iniciou às quatorze horas e foi encerrada por volta das dezoito.
Foi um dia muito divertido, pois o grupo fez a apresentação musical e conversou; Aproveitou-se ainda para ouvir os dotes musicais de um dos internos.
Além de tal tipo de medida favorecer a saúde mental dos idosos, possibilita ainda uma melhor formação para os acadêmicosque começam a se aproximar dos futuros pacientes e a se comprometer com os mesmos.
Muitas vezes o que falta para a efetivação de um bom atendimento médico não é técnica e sim comprometimento com a dor do outro, com a situação de sofrimento que não pode ser encarada como distante, pois se assim for será tratada com indiferença e com fichas de encaminhamento médico. Uma sucessão de encaminhamentos faz com que o paciente se torne uma "batata quente" lançada de um profissional para o outro.
É preciso que o profissional se comprometa e resolva o problema, pelo menos a parte que lhe cabe.
É preciso que exista comprometimento com a profissão.
É preciso que o profissional se comprometa em aliviar as dores do outro.
Humanizarte com os idosos
Segundo a OMS: "Para promover la salud se debe ir más alla del mero cuidado de la misma. La salud ha de formar parte del orden del día de los responsables de la elaboración de los programas políticos, en todos los sectores y a todos los niveles, con objetivo de hacerles tomar conciencia de las consecuencias que sus decisiones pueden tener para la salud y llevarles así a asumir la responsabilidad que tienen en este respecto." (OMS, 1996, p.368)
A medida da visita pode parecer pouco diante do muito que ainda precisa ser instalado na assistência á saúde. Mas sem o primeiro passo nenhuma caminhada jamais se findará.
Só iniciando uma humanização simultânea em medidas de promoção de saúde e de assistência hospitalar é que se chegará a resultados esperados que consistem em possibilitar maior consolo para todos os pacientes em todos os setores de prestação de serviço de saúde.
Afinal, de acordo com o primeiro dos aforismos hipocráticos, pode-se obter a melhor definição da arte médica de todos os tempos, jamais superada: "A vida é breve, a arte é longa, a ocasião fugidia, a experiência enganosa, o julgamento difícil".

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Liga de Genética Médica e Malformações Congênitas: Uma família

A família representa um grupo social primário que influencia e é influenciado, são pessoas ligados por descendência demonstrada ou estipulada a partir de um ancestral comum, matrimônio ou adoção.
A Liga de Genética tem se mostrado uma família com 22 integrantes que contam com uma convivência frequente propiciando crescimento mútuo por intermédio da adoção de afetos. A atual gestão tem focado os trabalhos nos pilares: ensino, pesquisa e extensão; E, mostra suas realizações.
No que tange ao ensino: em 30 de abril, véspera de feriado, a Liga contou com 100% de freqüência na apresentação de “GATTACA”. O filme consiste em uma ficção científica produzida em 1997, que supõe um futuro no qual o sere humano é escolhido geneticamente em laboratórios e a pessoa concebida biologicamente é considerada inválida. O protagonista nasce sem preparos genéticos e possui o desejo de ser um astronauta, mas, tem em seu código genético predisposições à doenças que tornam o seu sonho impossível. Escondendo sua identidade genética e com muito esforço vence as objeções do meio dando uma lição de vida ao mostrar que diante da vontade humana e do esforço até o tempo cede e os sonhos tornam-se realidade.
Depois do filme muitas questões foram levantadas acerca da visão social da qualidade genética, da manipulação genica que cria novos preconceitos e divisões sociais, e ainda, sobre o uso indevido da ciência e a respeito da tão conhecida busca por filhos perfeitos.
A sessão contou com a presença do acadêmico Palti Massa, que apesar de não ser membro da Liga honrou a sessão com sua visita. O filme foi regado a refrigerante acompanhado por pipocas estouradas pelas acadêmicas: Mayara Reis e Mayra Lopes.

Pesquisa
No que se refere à pesquisa a Liga centra em revisão de literatura e em aulas que são apresentações de artigos. As apresentações são realizadas com o auxílio e supervisão da coordenadora da Liga: Roseane de Souza Cândido Iruleghi.

Extensão
No campo da extensão iniciou-se o acompanhamento de cirurgias que segue uma escala de plantões que propicia aos membros e ouvintes acompanharem cirurgias feitas pelo coordenador da Liga, o professor: Hélio Alves. A acadêmica que inaugurou o projeto foi Lucierla de Oliveira, do primeiro ano. Após a experiência que se deu em uma manhã de sábado, a mesma relatou que foi emocionante aprender a paramentação cirúrgica e assistir ao procedimento.

Evento
Como projeto a realizar existe o Simpósio marcado para os dias 02 e 03 de outubro em conjunto com o “Projeto Humanizarte” e a recém fundada “Liga de Cuidados Paliativos”.
Segundo Mayra Lopes, presidente da Liga de Genética Médica e Malformações Congênitas: “A roda existe, temos que fazê-la girar. O bom resultado obtido até agora é fruto do empenho de todos os membros seja com a freqüência exemplar, com o cuidado na elaboração das aulas a serem apresentadas, com a responsabilidade de ir assistir as cirurgias sábado de manhã. O que noticiamos é a parte visível do comprometimento de todos. Recorda-me o dito egípcio: ‘Todo trabalho gera frutos, e, em todo fruto existiu um trabalho’. A felicidade nos empreendimentos da Liga não se dá somente devido ao resultado obtido, mas sim da influência de cada encontro em nossa formação, de algo que realizamos juntos, pode-se dizer de um trabalho praticamente em família”.
Publicado em:
Acesso: 12/05/2009

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Resumo da obra: "Se a boa escola é a que reprova, o bom hospital é o que mata."

"Triste não é mudar de idéia.
Triste é não ter idéia para mudar".
Francis Bacon

manicômio


APRESENTAÇÃO
A obra possui dezesseis capítulos, com tendência multidisciplinar, constatando que sem auto-estima, há maior dificuldade de se assimilar conceitos, ainda mais conceitos novos que o sistema educacional vem propondo.

CAPÍTULO I: “A FALÁCIA DA CURVA DE GAUSS”
Inicia avaliando o uso da curva de Gauss como sitematizadora da situação dos alunos na qual os bem dotados estão acima, e, os menos dotados abaixo. O que embasa que em avaliações normais há reprovação para os abaixo da curva.
Tal processo avaliativo dito normal não averigua fatores como a criatividade do sujeito, o tempo gasto, e o ser humano envolvido na situação.
A postura científica da curva de Gauss não deve se aplicar a educação, pois tende a coisificá-la e a justificar o conceito de “reprovar com justiça”.
A pessoa humana martela a curva com suas diversas virtudes, diversos tipos de inteligência.

CAPÍTULO II: “AMASSANDO A CURVA”
Sugere que a competição começa com o professor no objetivo e classificar o aluno ao invés de tentar levar a todos a atingir o conhecimento. Mostrando a problemática de pouco tempo para a grande carga de conteúdo.
Expõe que a educação vem sendo enterrada pela normatização e uniformização com padrões rígidos quanto à temporalidade da formação.
Faz uma analogia com o tempo de aprendizado e tempo de cura, mostrando que ambos os casos contam com diferenças individuais e que tanto a convalescença quanto o aprendizado não obedecem a padrões de tempo pré-estipulados.
O importante é chegar ao destino e não o tempo que se gasta para tal. O importante é tentar várias vias, várias formas de aprender, mas sempre tentar.
Cita o sistema do escotismo, criado por Baden Pawel em que o grupo fica livre, mas que em determinada hora o estabelecido deveria estar pronto para a inspeção do campo e formatura para a bandeira. Considera que estabelecer competição é dizer que independente do esforço, grupos de menor experiência não tem premiação, ou mesmo, não tem tanto valor quanto os bons. Esse tipo de padrão competitivo é uma fábrica de desanimados.
Quem ensina deve centrar no aprendizado da maior parte do grupo possível.

CAPÍTULO III: “O CURRÍCULO MATA”
A vivência profissional não envolve somente o currículo escolar, mas a experiência de vida. Segundo o dito latino: “Non scholae sed vitae discimus”, não aprendemos para a escola, mas para a vida.
O grande problema da escola é que se decora para testes, aprendem-se macetes, dribla-se a avaliação. Preparar-se para a vida fica em plano secundário ou mesmo esquecido.
Nas palavras do autor: “... estudou coisas enormes, quantidades que não cabiam em cadernos e quantos livros você foi obrigado a comprar e nunca usou...”
A maioria dos assuntos pesquisados não tem oportunidade de ser usado na vida, e quanto tempo é perdido enquanto poderia estar se estudando o que se gosta.
Os pilares da escola são: currículo, programa e nota; Em detrimento ao saber e ao deleite humano.
Chega-se a necessitar de um bisturi pedagógico que corte fundo. O currículo tem que abranger leitura, visitas, relatórios, observações e movimento.
É importante o cuidado de perceber a necessidade de disciplinas novas, lecionando coisas diferentes.
Transcrevendo literalmente: “Cada disciplina é ministrada para atender à corporação dos docentes, enquanto a sociedade é muito maior que a corporação de docentes”.
A educação tem que servir à sociedade.

CAPÍTULO IV: “A QUANTIDADE SATURA”
Ministrar muito conteúdo leva ao desanimo e a completa entrega diante das dificuldades, pois as mesmas parecem impossíveis de serem superadas.
O estudo que deve ser um processo de renovação pessoal passa a ser uma tortura da inteligência. Observa-se o aluno a aprender o que gosta e o que não gosta, o que é necessário e o absolutamente desnecessário, o atualizado e o desatualizado.
A função de enxugar o conteúdo é do professor. Mas, o professor também está marcado pela saturação das quantidades, ele foi formado em um sistema onde o mestre é o agente de uma sociedade a favor de uma elitização.
Perpetua-se os erros, porque assim que foram ensinados e nunca se ensinou a respeito do questionamento que é feito.
O limite humano é dado pelo tamanho das idéias.

CAPÍTULO V: “O QUE É QUALIDADE?”
Segundo o autor qualidade é a linguagem da moda que incorpora conceitos e depois critica-os. Alguns ainda usam o termo reciclagem profissional como que a aproveitar o lixo intelectual.
O grande problema da quantidade é a insuficiência das ferramentas disponíveis. Não adianta conceituação e sistematização sem a presença do elemento humano.
Um grande acontecimento educacional é quando dois seres se encontram e suas idéias se chocam, tais seres se tornam diferentes e é imprevisível o que poderá suceder a cada um. A excelência humana é mais completa que a excelência acadêmica. E, a verdadeira qualidade em educação depende é da qualidade humana. Se eficiência é fazer bem feito, eficácia é fazer o que deve ser feito. Só eficiência não basta, é preciso ter eficácia, fazer o que deve ser feito.

CAPÍTULO VI: “A UTILIDADE ANIMA”
Quando alguém percebe que faz coisas úteis, melhora sua auto-estima e a alegria anima todo o seu organismo.
O amargor não cura, a vida tem seus dissabores, mas aumentar os que já existem é um contra-senso.
Deve-se tirar o que não é útil do programa para proporcionar um conhecimento com prazer.

CAPÍTULO VII: “A ATUALIZAÇÃO MOTIVA”
Estudar conteúdos atuais é motivador porque existe uma relação imediata com a realidade da vida.
O autor denomina os professores arcaicos de “professauros” e usa a máxima: “Quem não se atualiza, fossiliza-se”.

CAPÍTULO VIII: “A REPROVAÇÃO COMPROMETE A INSTITUIÇÃO”
Diante da reprovação o aluno é colocado como grande culpado do seu fracasso.
Com a reprovação como tradição, a escola serve mais para impedir o sujeito do que para promovê-lo. Tal fato deixa a libertação proposta por diversos sistemas de educação restrita ao papel, pois não efetiva mudanças no curriculum ou no programa.
Mediante a visão da escola, não importa o tipo de cidadão que é capaz de formar, mas a capacidade que tem de promover um estudante, mesmo que ele passe por cima dos demais, de acordo com uma competitividade selvagem aprendida entre muros, entre os muros da escola.
Segundo a obra: “A reprovação está dentro de um contexto, não se trata de um fato isolado. São culpa da escola, do aluno, da família e do sistema.”
O grande problema da maioria dos professores é que a matéria prima pode não reagir porque não tem vontade, mas os alunos são seres humanos e podem dizer que concordam ou não. Se o aluno diz não a algum conteúdo é sempre culpado por não aprender, por não querer aprender. Os demais isentam-se da culpa que é toda lançada nele.
A reprovação é sempre mais um problema de “ensinagem” do que de aprendizagem.

CAPÍTULO IX: “OS PONTOS FORTES DOS ALUNOS”
“O papel do professor é buscar os pontos fortes dos alunos.” – Santo Agostinho;
Quando o professor busca o ponto fraco do aluno, ele mesmo se sente frustado. É preciso promover mais e recriminar menos.
Os professores, de um modo geral, assinalam o erro e rabiscam bem o que está errado com canetas especiais para chamar atenção sobre o erro. Tal método perde a força de fixação acerca do acerto. Até a família foi sugestionada de tal forma, e querem que o professor marque o erro e corrija.
O professor deve apenas escrever a forma correta.
Ninguém precisa aprender sofrendo.

CAPÍTULO X: “A ESCOLA DO FUTURO”
Terá que lidar com a questão do virtual e uma possível redução das manifestações humanas. Com o mundo virtual também será mais fácil aprender.
Deve-se humanizar o novo contexto para não haver perda da que existe de precioso na humanidade: a capacidade de distinção entre o ser e o não ser.
O autor relata que a escola do futuro vai requerer dos educadores uma transformação na linha da humanização. As inteligências múltiplas deverão ser desenvolvidas para embasar as pessoas para lidarem com situações imprevisíveis.

CAPÍTULO XI: “MUDANDO PARADIGMAS”
Os paradigmas dão segurança em relação ao passado e criam o medo em relação ao novo.
É a ótica do negativo que justifica o título da obra. O fato de considerarem a reprovação como meta, de não cultivar o prazer de estar na escola.
Existem muitos paradigmas em relação à educação, que se instalaram e não auxiliam o aprendizado.
Alguns deles são: seriação, nota, bimestre letivo, dependência, recuperação, dentre outros.
Há professores que se realizam nesse conceito para pagar, sem perceber, tributos aos paradigmas do passado.
Nas palavras do autor: “O que serve fica de lado, o que não serve e ajuda nas reprovações, retenções e dependências são usadas à larga porque muitos ainda pensam que a boa escola é a que reprova, como se o bom hospital fosse aquele que matasse”.
A escola não pode mais depender dos medrosos que fogem da ousadia de viver.

CAPÍTULO XII: “SOMBREAMENTO”
Algumas instituições classificam os acadêmicos de acordo com o nível do que deixou de aprende, o que é entendido como sobreamento.
Não basta ser humano, o código lingüístico tem que acompanhar, pois como se pensa influi em como se fala e o modo de falar é a expressão da própria vida.

CAPÍTULO XIII: “ABATIMENTO”
Um professor não pode se mostrar abatido, pois, abatimento é um sintoma grave que acaba sendo transferido para o aluno, que por sua vez, transfere para o conteúdo ministrado.
Assim, os alunos passam a achar sem saber as razões, que a escola é insuportável, chata, um lugar a ser evitado.
Uma postura de desânimo expulsa os alunos da escola, pois os mesmos se entediam com a lamúria.

CAPÍTULO XIV: “PROSTRAÇÃO”
“Abracei o vento como último momento na praia e fui dormir tendo o nada como companhia”.
Cada profissão tem seu padrão de realização, assim como o circense se nutre com a platéia. O professor não pode e não deve nutrir-se no nada, deve nutrir-se do prazer de ver o que ensinou; De perceber que preparou os seres humanos para o imprevisível do amanhã, ensinando pessoas a entender as demais em busca de soluções.

CAPÍTULO XV: “ÂNIMO E PERSISTÊNCIA”
“Temos primeiro que compreender que não há vida sem risco – e que quando nossa alma é forte, tudo mais é secundário, até os riscos”. – Elie Wiesel (sobrevivente do Holocausto).
O autor defende a necessidade da existência e adoção de valores, ressaltando que é fundamental focar em um objetivo. Pois, sem valores não se chega à parte alguma, ou ainda aonde o vento levar se houver vento.
Uma solução diante da divergência de opiniões é a democracia por possibilitar a vida de forma mais harmônica em meio ao pluralismo. Viver o plural não precisa ser uma guerra de oponentes, mas uma resultante de sensatez.
O capitalismo termina com a sentença: “A escola precisa ser pensada na linha da informação, da criatividade, da intuição e do sonho”.

CAPÍTULO XVI: “EDUCAÇÃO GERADA NA ESPERANÇA”
A esperança dá a certeza, a certeza de que os problemas podem ser superados mediante a uma postura de metas claras.
Uma saída para os problemas educacionais está em estabelecer metas claras e saber os valores nos quais embasar-se e escolher os valores adotados que guiarão as ações.
A alegria deve aliar-se a felicidade que é capaz de promover a realização.
Segundo Einstein, se o sujeito faz parte do universo, quando o mesmo cresce, o universo todo cresce com ele.

REFERÊNCIA:

WERNECK, Hamilton. "Se a boa escola é a que reprova, o bom hospital é o que mata". 8 edição. Rio de Janeiro: DPeA, 2002.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Trote

Trote pode ser uma travessura feita por telefone, uma brincadeira; No contexto universitário refere-se ao conjunto de atividades a que novatos são submetidos em faculdades.
A palavra "trote" possui correspondentes em vários idiomas, como trote (espanhol), trotto (italiano), trot (francês), trot (inglês) e trotten (alemão). Em todos o termo se refere a uma certa forma de se movimentar dos cavalos, uma andadura que se situa entre o passo (mais lento) e o galope (mais rápido). Todavia, deve ser lembrado que o trote não é uma andadura normal e habitual do cavalo, mas algo que deve ser ensinado a ele.
Da mesma forma, o calouro é encarado pelo veterano como algo que deve ser domesticado, em suma, o calouro deve "aprender a trotar".
Da mesma forma, denominar o calouro de bixo (ou bixete, se for mulher), parece querer indicar que o calouro deve ser humilhado a ponto de nem mesmo merecer que a palavra bicho seja escrita corretamente (Zuin, 2002, p. 44).
O trote estudantil tem seu histórico traçado a partir do começo das primeiras universidades, na Europa da Idade Média. Surgiu com o hábito de separar veteranos e calouros, aos quais não era permitido assistirem as aulas no interior das respectivas salas, mas apenas em seus vestíbulos, de onde veio o termo "vestibulando".
Por razões profiláticas, os calouros tinham as cabeças raspadas e suas roupas muitas vezes eram queimadas. No século XIV, as preocupações com a higiene haviam se transformado em rituais aviltantes, com nítida conotação sadomasoquista. Isto é observado nas universidades de Bolonha, Paris e, principalmente, Heidelberg, onde os calouros, reclassificados como "feras" pelos veteranos, tinham pelos e cabelos arrancados, e eram obrigados a beber urina e a comer excrementos antes de serem declarados "domesticados".
Segundo Van Gennep, criador do conceito, os ritos de passagem podem ser classificados em três grupos principais: separação (funerais), agregação (casamento) e margem (iniciação). As fronteiras entre tais ritos não são estanques, e sim dinâmicas; um comumente, implica um outro (Van Gennep, 1978, p. 31).
O trote se classifica como um rito de passagem de margem e permite que sejam extraídas quatro conclusões preliminares (Vasconcelos, 1993, p. 14-15): O trote é um cerimonial que está entranhado no seio da cultura acadêmica; O caráter iniciático do trote é confirmado por todos os seus participantes; O trote representa um ritual de violência e agressão contra o calouro; O trote é um rito de passagem às avessas, representando uma prática oposta aos valores humanistas da universidade.
Mas a ridicularização não existira e não se perpeturia se não tivesse um sentido, algo que sustentasse tal tradição. O que ocorre no trote que faz com que a prática se perpetue é o fato de o mesmo permitir que as pessoas se conheçam. É um princípio de relação de poder, na qual o poder é claramente estabelecido.
Diante de tal ordem implantada a instituição de ensino se viu chamada a transformar ou mesmo amenizar tal realidade: lançou-se a semana do trote.
Semana é um período de tempo de sete dias consecutivos. A origem da expresão vem de sptimana que significava sete manhãs. A semana foi uma evolução na orientação de espaço de tempo, cujo início ocorreu pela relação do homem com a natureza.
A semana do trote é, portanto, a primeira semana do acadêmico. É elaborado um cronograma de atividades que visam estabelecer convivência. Alguns entendem o trote como uma festa social.
Na semana do trote existem atividades durante o dia como “aula trote” (uma aula ministrada por um colega que os calouros acreditam ser a real), brincadeiras, dentre outras atividades. Durante a noite faz-se festas para que os acadêmicos possam se conhecer. É óbvio que a relação de poder das atividades é forte no lado dos veteranos, o que precisa ser melhorado para que o trote se tornar mais cordial.
Uma tentativa de estabelecer regras para o trote e tornar os fatos mais diplomáticos é o concurso “miss bixo”, organizada pelo D.A. (Diretório Acadêmico), apresentando "bixos" aos veteranos. Funciona da seguinte maneira: ocorre um desfile no qual "bixos" vão vestidos de mulher e as "bixetes" vão de homem. O mais bem fantasiado e que tiver maior torcida ganha o prêmio.

REFERÊNCIAS:
MATTOSO, G. O calvário dos carecas: a história do trote estudantil. São Paulo, EMW, 1985.
VAN GENNEP, A. Os ritos de passagem. Petrópolis, Vozes, 1978.
VASCONCELOS, Paulo Denisar. A violência no escárnio do trote tradicional. Santa Maria, UFSM, 1993.
ZUIN, Antônio Álvaro Soares. O trote na universidade-Passagens de um rito de iniciação. Cortez, São Paulo, 2002)
ZUIN, Antônio Álvaro Soares. O Trote no Curso de Pedagogia e a Prazerosa Integração Sadomasoquista. Educ. Soc. [online]. Ago. 2002, vol.23, no.79, p.243-254. Disponível na World Wide Web: Scielo. ISSN 01017330.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Um só coração

“Amor e desejo são coisas diferentes

Nem tudo que se ama se deseja. E,

nem tudo o que se deseja se ama.”

Miguel de Cervantes


A palavra coração é amplamente difundida, e não há quem sobre ele deixe de falar algo. Esse pequeno órgão muscular, com peso variando entre 256 e 390 gramas no homem e 198 a 270 gramas na mulher, nunca se cansa chegando a bombear mais de cinco milhões de litros de sangue durante toda a vida.

Desde a antiguidade é associado a questões de cunho emocional. Tal associação se deu porque quando se estimula o sistema nervoso central o mesmo tende a alterar o ritmo cardíaco o que é facilmente percebido pelo indivíduo. O prazer e o amor podem estimular o coração de modo que o sujeito pode percebê-lo pulsando e até sentir sua vibração por todo o corpo.

Devido às inúmeras alterações do ritmo cardíaco mediante as emoções, o mesmo foi assumindo conotações relacionadas aos sentimentos.



Mas nem sempre foi assim, na antiguidade acreditavam que ele era a sede do conhecimento daí surgiram terminologias como saber “de cor”, saber “decorado”, saber “de coração”. Afinal, tentar lembrar ou mesmo evocar memórias fortes e significativas pode alterar perceptivelmente o ritmo cardíaco.

Ainda há de se considerar que a partir da idade média, o mesmo passou a ser considerado como sede da vida, pois os mortos já o possuíam mais batimentos. Só muito depois, com o surgimento de técnicas médicas que o mantinham bombeando e com o conceito de morte aliado ao óbito encefálico é que o mesmo perdeu essa conotação de centro da vida do corpo humano; Sendo tal título transferido ao sistema nervoso central.



Já simbolizou o lócus da centelha divina nos homens, a sede da vida, e até o amor sublime do “Sagrado Coração”. Os poetas e artistas de uma forma geral utilizaram amplamente o coração como símbolo dos sentimentos.

Fattini avaliado a anatomia define o coração na página 89 como: “órgão muscular, oco, que funciona como uma bomba contrátil-propulsora. O tecido muscular que forma o coração é do tipo especial – tecido muscular estriado cardíaco, e constitui sua camada média, ou miocárdio”.

Quanto à forma Fattini na página 92 cita: “O coração tem a forma aproximada de um cone truncado, apresentando uma base, um ápice e faces (esternocostal, diafragmática e pulmonar). A base do coração não tem delimitação nítida, isto porque corresponde a área ocupada pelas raízes dos grandes vasos da base do coração, isto é, através dos quais o sangue chega e sai do coração.”


Coração dissecado

(Fattini)


Mediante a descrição proposta, há de se questionar a origem do desenho estizado do coração, que tem sido amplamente difundido atualmente.

O desenho estilizado é uma imagem modificada de algo real de forma a tornar a figura plana e geométrica, imitando por captação e acentuando as semelhanças para facilitar o reconhecimento do que é representado.

O desenho estilizado do coração consiste em dois arcos que se encontram, começando de forma redonda e afilando na porção inferior; Quanto a origem da forma do coração estilizado existem duas hipóteses.



Coração estilizado


A primeira embasa-se na descrição anatômica dos compartimentos cardíacos. Em “Anatomia” de Ernest Gardner, terceira edição, página 327: “O coração está situado no mediastino médio. É dividido em duas metades, direita e esquerda, por septo longitudinal orientado obliquamente. Cada metade consiste de uma câmara chamada átrio, que recebe sangue das veias, e de outra chamada ventrículo que impulsiona o sangue para o interior das artérias.”

Alguns achados sugerem que o coração estilizado aparece sob o aspecto de dois arcos porque o coração é dividido em duas metades, e, cada metade seria representada por um arco.


Coração dissecado

(duas câmaras internas)


A segunda hipótese possui maior carga romântica e simbólica, sugere que a figura do coração estilizado consiste em dois arcos semicirculares que representam dois arcos aórticos o que o afasta bem dos contornos anatômicos real do coração que se parece com um triângulo invertido. Passa a ser utilizado a partir do fim da idade média, e remete ao contorno efetuado pelo arco aórtico em dois corações juntos a partir da posição de dois corpos abraçados um de frente para o outro.


A estrutura se forma a partir de um corte antero-posterior a partir da posição anatômica. O coração estilizado é mais que a representação anatômica de uma estrutura, pois sob certo aspecto pode ser avaliado como a união de arcos aórticos. A união de arcos aórticos de dois seres.

Montagem a partir de dois arcos aórticos


A simbologia se embasa na ciência, pois para se consolidar depende das dissecações. Na página 92 do livro “Anatomia humana Básica”, Fattini descreve o arco aórtico: “Do ventrículo esquerdo sai a artéria aorta, que se dirige inicialmente para cima e depois para trás e para a esquerda, formando assim o arco aórtico.” Arco aórtico é um formato que a aorta assume.



Em “Anatomia”, Ernest Gardner, descreve a aorta na página 347, da seguinte forma: “É a principal artéria sistêmica do corpo”.

Artéria, palavra de origem grega. Formada a partir de aér que significa ar ; E, térion que significa ducto. Há ainda fontes que defendem: tereo que significa, “eu levo”, “eu contenho”. Tal nomina provém do fato de Hipócrates chamar “artéria” a árvore bronquial e “flebos” aos vasos. Isso se deu em decorrência do fato de os anatomistas gregos antigos acreditarem que as artérias continham ar e as veias continham sangue. Tal dedução proveio das dissecações nas quais era possível observar que tais vasos encontravam-se vazios.



Daí também provavelmente proveio a forma latina arteria, com origem em aerum que significa ar e teres que significa cilindro. Por séculos foram denominados “arteria leiai”, ou seja, vasos lisos em contrapartida a traquéia e os brônquios eram “arteria tracheia” que significava “vasos rugosos”.

Galeno constatou a existência de sangue nas artérias, mas, para não desmentir a teoria humoral, descreveu que nelas misturava sangue misturado com ar. Somente no século XVII, os trabalhos de Miguel Serveto, Realdo Colombo, Fabrizzio D’Acquapendente e William Harvey demonstraram claramente a circulação sanguínea nas artérias. A percepção real demorou a ser atingida porque devido ao último pulsar do coração, as artérias se esvaziavam mandando o sangue para o tecido, ficando vazias no cadáver.

Gardner, na página 347, descreve a aorta: “Divide-se em aorta ascendente, arco da aorta e aorta descendente. O segmento da aorta.”



A aorta ascendente situa-se no mediastino médio e se estende da raiz da aorta para cima e para a direita até a altura do ângulo esternal. Originam-se dela as coronárias direita e esquerda. Após, forma-se o arco da aorta onde após a reflexão a mesma continua como aorta descendente, dirigindo-se para a esquerda, situada ventralmente em relação à traquéia, e orientando-se para trás e para baixo, acima do brônquio esquerdo.



As elucidações acerca do coração possibilitam entender a beleza da anatomia que é fundamentalmente descritiva e permite a estilização de estruturas o que confere ao corpo, ao ser, um valor simbólico com representatividade emocional e beleza mítica. Sendo assim, a anatomia desde os primórdios do seu surgimento se alia a arte.


Cordas tendíneas

(interior do coração)

A anatomia permite visualizar o que Charles Dickens descreve:

"O coração humano é um instrumento de muitas cordas. O perfeito conhecedor dos homens sabe fazê-las vibrar todas, como um bom músico."