domingo, 31 de maio de 2009

Céu Cinza

"Então, então você acha que consegue distinguir
O céu do inferno. Céus azuis da dor"
Pink Floyd

Caelum é o espaço infinito onde se movem os astros e estrelas, cotidianamente conhecido como céu. Pode ser referencia ao céu mitológico, significar a criação do mundo: o firmamento. É o lugar onde as aves voam, de onde a chuva cai, no qual os relâmpagos brilham. É a morada do sol, mesmo quando o sol lá não se encontra. O palco da Lua, o caminho das estrelas, habitado por anjos, a morada de Deus. O sonho humano é explorar os céus.
Para dar a dimensão do céu só o idioma hebraico, para o qual a palavra não possui singular, sugerindo sempre “os céus”, o que dá idéia da amplitude, da imensidão, da pefeição nele contemplada.
Primeiramente, o céu é a tela das cores da natureza; Permeado por todos os comprimentos de ondas de luz, assume a cor azul mediante o olhar do observador. Isso se dá porque quando a luz solar chega na Terra, encontra a atmosfera como obstáculo, e as ondas de diferentes tamanhos ao esbarrar nas moléculas de ar começam a se espalhar de diferentes formas, sendo que as de menor comprimento são as que se espalham com maior facilidade e as mesmas consistem nas de cor azul.
Quando além das moléculas de ar existem outras partículas ou tipos de poeira, as ondas azuis se diluem obtem-se a visualização de outros tons, o mesmo também pode ocorrer no por-do-sol, quando os raios de luz incidem obliquamente sobre a Terra permitindo outras cores: rosa, amarelo, cinza...
A maioria dos indivíduos prefere o céu azul, palavra derivada do árabe e persa “lázúrd”, por “lazaward” que significa “céu sem nuvens”. Os fotógrafos chamam o melhor céu pra fotografar de “céu de brigadeiro”, que consiste em céu azul, sem nuvens, pois a presença de nuvens altera a luminosidade na fotografia. A expressão idiomática “tudo azul” se refere ao céu em paz, a um estado de bem-estar e plenitude. Já na literatura inglesa o ceú que expressa contento é o cor-de-rosa.
De acordo com pesquisas, a cor do céu altera o estado emocional dos indivíduos, e aqueles que moram em lugares de ceú mais escuro ou que ficam sob luz artificial durante longos períodos tem maior propensão a desenvolver quadros depressivos.
O sujeito tende a associar as cores a sentimentos, experiências. A cor cinza é associada ao pó, a neblina, ao mar sob tempestade.
De acordo com a teoria psicológica das cores, o cinza remete a tristeza, ao desânio, a seriedade, ao passado. A palavra deriva do latim “cinicia”, e remete a posição intermediária entre luz e sombras.
O ceú cinza é renegado pela sociedade atual onde a felicidade é lei: ser feliz independente da felicidade dos demais. Uma sociedade na qual deve-se aparentar felicidade para manter as relações sociais se não se está feliz. Além de infeliz, se uma pessoa reclama ainda se torna solitária, porque as pessoas estão ocupadas demais para ver e entender as insufuciências da criatura humana.
As fotos do orkut são de pessoas sorridentes, as cores são muitas, presente na moda, nas roupas. Se alguém usa cor escura, certamente encontrará quem pergunte se pertence algum grupo específico, se é deprimido, e assim os rótulos vão sendo pregados nos seres.
Ora, é obvio que o fim que se busca na existência é ser feliz, mas até para conhecer e reconhecer a felicidade é necessário uma dose de dor, de se conhecer a tristeza. Somente assim é possível estabelecer parâmetros para avaliar a situação, a vivencia, para se definir felicidade.
Uma sociedade que nega a tristeza na vida, nega cemitérios, nega dias cujo céu é acinzentado. Mas o céu cinza permite antes de tudo uma reflexão sobre os valores que são conferidos na relacão homem mundo.
Diante de um céu cinza, a dor encontra lugar pra existir no mundo. A insatisfação que faz o sujeito lutar por dias melhores pode ser representada. Quem sobrevive e até contempla um dia cinza tem humor, ri da tristeza e elabora assim o luto. Quem sobrevive a um dia cinza sabe que os dias cinzas podem desanimar, mas não matar, o que remete a máxima de Nietzsche que menciona: “O que não mata fortalece.” Fortalece porque fica claro que a cor do céu não é tão “vital”, que a jornada continua, mesmo que por inúmeras situações de tristeza talvez parecesse melhor que a existência ali se findasse.
Um dia cinza lembra o Antigo Testamento afinal os textos ali escritos contam com uma carga significativa de “princípio da realidade” e de realidades cruéis que ultrapassam a força humana para vencer ou superar. Realidades e dores mediante as quais só resta ao ser suportar, e, que ironicamente só pode ser suportada com leveza de espiríto de quem aceita a realidade e sabe que mesmo com dor a vida continua. Que conta com uma carga de resignação digna do livro de Jó: “Deus deu, Deus tirou, bendito o nome do Senhor.”
Resignação consiste em saber que os fardos da vida quando carregados, mesmo que não resolvidos, dão um sentido ao trabalho, mesmo quando o trabalho é de Sísifo.
Segundo a mitologia, Sísifo era o mais astuto dos mortais, sua inteligência era uma ofensa aos deuses. Certa vez, viu uma águia sobrevoando sua cidade com uma jovem nas garras, ao reconhecer a jovem Sisifo trocou a informação de onde a mesma estaria por uma fonte de água para o povo. Mas o fato de impor uma condição, irou Zeus que enviou o deus da morte contra Sísifo. Sísifo porém, enganou a morte elogiando a sua beleza e dando-lhe um colar que na verdade era uma coleira e mantendo a morte aprisionada e fugindo do seu destino.
A morte prisioneira, não matava ninguém e o deus dos infernos, se enfureceu aliando-se ao deus da guerra, que estava indignado por não morrer ninguém em batalhas. Os deuses então libertaram a morte, que matou Sísifo cumprindo sua missão.
Não contavam porém, que o mesmo havia pedido para sua mulher não enterrá-lo e logo que chegou ao inferno foi reclamar que não teve enterro e pediu um dia de prazo para se vingar dos que não o enterraram. Pedido concedido, o mesmo retornou a vida e fugiu com sua esposa. Enganando a morte pela segunda vez.
Quando morreu de velhice, foi considerado um grande rebelde e condenado a um castigo eterno, junto a Prometeu. Mas seu castigo consistia em rolar uma grande pedra de mármore com suas mãos até o cume de uma montanha e quando estavivesse quase chegando ao topo, a pedra rolava novamente para baixo.
E, desde então, todo esforço inútil é denominado “trabalho de Sísifo”. Remetendo a idéia de trabalho inútil. Tais idéias e mitos, podem remeter a um niilismo a uma falta de sentido e direção da vida, da existência. A carga de sentido está além, assim como o sentido de um céu cinza que não pode ser reduzido a uma simples cor.
Avaliando segundo Schopenhauer, a existência humana mediante a interpretação universal é insignificante por ser imergida na temporalidade, pois o atual, o momento vigente é um grande nada quando comparado a infinidade que o tempo possui quando avaliado sob o prisma do eterno.
A simples questão da cor do céu pode ser profunda por permitir a existência e expressão da tristeza até no céu, lembra ao humano o seu tamanho diante da imensidão das possibilidades. Faz refletir que jamais o ser saberá se suas ações estão corretas em “absoluto”, se as reações das ações serão benéficas em “absoluto”. Só resta as criaturas saber se o que é feito é feito por amor. Pois, só o amor confere forças as mãos para a realização de trabalhos inúteis, de ações que se perdem no tempo, de lutar contra fatos indissolúveis, de circunstâncias que não se resolvem e podem apenas melhorar. Não há como saber se é bem ou mal, mas a perspectiva interior possibilita saber se as ações são guiadas e embasadas no amor.
E, o que resta é: amar, fazer o que quiser e suportar as consequencias. Só assim pode-se contemplar um céu cinza e sorrir.

Um comentário:

  1. Céu Cinza dá muito soninho!!!
    Mas apesar disso dias cinzas são tão felizes quanto dias azuis!!!
    O nosso professor faz muitos trabalhos de Sísifo tentando mudar nossos colegas...
    Adorei :)
    May

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