sexta-feira, 1 de maio de 2009

Um só coração

“Amor e desejo são coisas diferentes

Nem tudo que se ama se deseja. E,

nem tudo o que se deseja se ama.”

Miguel de Cervantes


A palavra coração é amplamente difundida, e não há quem sobre ele deixe de falar algo. Esse pequeno órgão muscular, com peso variando entre 256 e 390 gramas no homem e 198 a 270 gramas na mulher, nunca se cansa chegando a bombear mais de cinco milhões de litros de sangue durante toda a vida.

Desde a antiguidade é associado a questões de cunho emocional. Tal associação se deu porque quando se estimula o sistema nervoso central o mesmo tende a alterar o ritmo cardíaco o que é facilmente percebido pelo indivíduo. O prazer e o amor podem estimular o coração de modo que o sujeito pode percebê-lo pulsando e até sentir sua vibração por todo o corpo.

Devido às inúmeras alterações do ritmo cardíaco mediante as emoções, o mesmo foi assumindo conotações relacionadas aos sentimentos.



Mas nem sempre foi assim, na antiguidade acreditavam que ele era a sede do conhecimento daí surgiram terminologias como saber “de cor”, saber “decorado”, saber “de coração”. Afinal, tentar lembrar ou mesmo evocar memórias fortes e significativas pode alterar perceptivelmente o ritmo cardíaco.

Ainda há de se considerar que a partir da idade média, o mesmo passou a ser considerado como sede da vida, pois os mortos já o possuíam mais batimentos. Só muito depois, com o surgimento de técnicas médicas que o mantinham bombeando e com o conceito de morte aliado ao óbito encefálico é que o mesmo perdeu essa conotação de centro da vida do corpo humano; Sendo tal título transferido ao sistema nervoso central.



Já simbolizou o lócus da centelha divina nos homens, a sede da vida, e até o amor sublime do “Sagrado Coração”. Os poetas e artistas de uma forma geral utilizaram amplamente o coração como símbolo dos sentimentos.

Fattini avaliado a anatomia define o coração na página 89 como: “órgão muscular, oco, que funciona como uma bomba contrátil-propulsora. O tecido muscular que forma o coração é do tipo especial – tecido muscular estriado cardíaco, e constitui sua camada média, ou miocárdio”.

Quanto à forma Fattini na página 92 cita: “O coração tem a forma aproximada de um cone truncado, apresentando uma base, um ápice e faces (esternocostal, diafragmática e pulmonar). A base do coração não tem delimitação nítida, isto porque corresponde a área ocupada pelas raízes dos grandes vasos da base do coração, isto é, através dos quais o sangue chega e sai do coração.”


Coração dissecado

(Fattini)


Mediante a descrição proposta, há de se questionar a origem do desenho estizado do coração, que tem sido amplamente difundido atualmente.

O desenho estilizado é uma imagem modificada de algo real de forma a tornar a figura plana e geométrica, imitando por captação e acentuando as semelhanças para facilitar o reconhecimento do que é representado.

O desenho estilizado do coração consiste em dois arcos que se encontram, começando de forma redonda e afilando na porção inferior; Quanto a origem da forma do coração estilizado existem duas hipóteses.



Coração estilizado


A primeira embasa-se na descrição anatômica dos compartimentos cardíacos. Em “Anatomia” de Ernest Gardner, terceira edição, página 327: “O coração está situado no mediastino médio. É dividido em duas metades, direita e esquerda, por septo longitudinal orientado obliquamente. Cada metade consiste de uma câmara chamada átrio, que recebe sangue das veias, e de outra chamada ventrículo que impulsiona o sangue para o interior das artérias.”

Alguns achados sugerem que o coração estilizado aparece sob o aspecto de dois arcos porque o coração é dividido em duas metades, e, cada metade seria representada por um arco.


Coração dissecado

(duas câmaras internas)


A segunda hipótese possui maior carga romântica e simbólica, sugere que a figura do coração estilizado consiste em dois arcos semicirculares que representam dois arcos aórticos o que o afasta bem dos contornos anatômicos real do coração que se parece com um triângulo invertido. Passa a ser utilizado a partir do fim da idade média, e remete ao contorno efetuado pelo arco aórtico em dois corações juntos a partir da posição de dois corpos abraçados um de frente para o outro.


A estrutura se forma a partir de um corte antero-posterior a partir da posição anatômica. O coração estilizado é mais que a representação anatômica de uma estrutura, pois sob certo aspecto pode ser avaliado como a união de arcos aórticos. A união de arcos aórticos de dois seres.

Montagem a partir de dois arcos aórticos


A simbologia se embasa na ciência, pois para se consolidar depende das dissecações. Na página 92 do livro “Anatomia humana Básica”, Fattini descreve o arco aórtico: “Do ventrículo esquerdo sai a artéria aorta, que se dirige inicialmente para cima e depois para trás e para a esquerda, formando assim o arco aórtico.” Arco aórtico é um formato que a aorta assume.



Em “Anatomia”, Ernest Gardner, descreve a aorta na página 347, da seguinte forma: “É a principal artéria sistêmica do corpo”.

Artéria, palavra de origem grega. Formada a partir de aér que significa ar ; E, térion que significa ducto. Há ainda fontes que defendem: tereo que significa, “eu levo”, “eu contenho”. Tal nomina provém do fato de Hipócrates chamar “artéria” a árvore bronquial e “flebos” aos vasos. Isso se deu em decorrência do fato de os anatomistas gregos antigos acreditarem que as artérias continham ar e as veias continham sangue. Tal dedução proveio das dissecações nas quais era possível observar que tais vasos encontravam-se vazios.



Daí também provavelmente proveio a forma latina arteria, com origem em aerum que significa ar e teres que significa cilindro. Por séculos foram denominados “arteria leiai”, ou seja, vasos lisos em contrapartida a traquéia e os brônquios eram “arteria tracheia” que significava “vasos rugosos”.

Galeno constatou a existência de sangue nas artérias, mas, para não desmentir a teoria humoral, descreveu que nelas misturava sangue misturado com ar. Somente no século XVII, os trabalhos de Miguel Serveto, Realdo Colombo, Fabrizzio D’Acquapendente e William Harvey demonstraram claramente a circulação sanguínea nas artérias. A percepção real demorou a ser atingida porque devido ao último pulsar do coração, as artérias se esvaziavam mandando o sangue para o tecido, ficando vazias no cadáver.

Gardner, na página 347, descreve a aorta: “Divide-se em aorta ascendente, arco da aorta e aorta descendente. O segmento da aorta.”



A aorta ascendente situa-se no mediastino médio e se estende da raiz da aorta para cima e para a direita até a altura do ângulo esternal. Originam-se dela as coronárias direita e esquerda. Após, forma-se o arco da aorta onde após a reflexão a mesma continua como aorta descendente, dirigindo-se para a esquerda, situada ventralmente em relação à traquéia, e orientando-se para trás e para baixo, acima do brônquio esquerdo.



As elucidações acerca do coração possibilitam entender a beleza da anatomia que é fundamentalmente descritiva e permite a estilização de estruturas o que confere ao corpo, ao ser, um valor simbólico com representatividade emocional e beleza mítica. Sendo assim, a anatomia desde os primórdios do seu surgimento se alia a arte.


Cordas tendíneas

(interior do coração)

A anatomia permite visualizar o que Charles Dickens descreve:

"O coração humano é um instrumento de muitas cordas. O perfeito conhecedor dos homens sabe fazê-las vibrar todas, como um bom músico."

6 comentários:

  1. SEU TRABALHO ESTAR ESPETACULAR+++++++++++++++

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  2. muito boom...excelente...me ajudou muito em uma pesquisa

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  3. ACHEI POR UM ACASO E AMEI... PARABÉNS LINDA!!

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