quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Genética Médica

Muito se tem discutido sobre liberação de pesquisas com embriões, células-tronco, clonagem e sobre a ética dos procedimentos relacionados à genética. Porém, a ciência que tem a ética no nome tem deixado a desejar no que diz respeito a aplicações da mesma.
Tal deficiência inicia-se ainda no período universitário, que em geral ensina os alunos a se preocuparem mais com as notas baixas na disciplina do que com a intensidade das dores que as malformações podem gerar nas vidas dos seus futuros pacientes. Mas o assassinato da ética não pára por aí, alcança os cientistas que perderam o sublime ideal de descobrir algo que seja um bem para a humanidade em proveito de uma busca científica objetivando apenas imortalizar o nome do pesquisador (supondo que este batizará a descoberta), que visa à comercialização da mesma ou a quantia que acompanha o Prêmio Nobel.
Quando Alfred Nobel, criador desse prêmio, redigiu o testamento deixando parte de sua fortuna aos vencedores, causou ceticismo e crítica por seu espírito internacionalista (pois não restringiu o prêmio aos seus compatriotas). Nobel, que viu a falência de seus pais, tornou-se posteriormente um renomado industrial e incentivador das artes, dedicou a maior parte de seu volumoso patrimônio à formação de um fundo que financiaria um prêmio anual para pesquisas e descobertas. Imaginava criar um prêmio para honrar pessoas que dedicaram seu tempo e sua vida em nome de um “amor universal”. Mas hoje, até os assassinos do Oriente Médio, em meio a pseudodiplomatas, ganham o Nobel da Paz. O prêmio tornou-se uma comenda negociada politicamente.
Hoje, vidas e sonhos são negociados politicamente. E alguns vêm discutir ética, genética. Não se humaniza um lugar colocando bichinhos pintados na pediatria, jalecos coloridos. Humanizar, alegrar, como? Se, ao achar graça em milagres diários como respirar, acertar e, por que não, errar, somos tachados de loucos...
“Sem a loucura, o que é o homem mais do que a besta sadia, cadáver adiado que procria?” (Fernando Pessoa).
A ciência não é desumana, os homens é que a estão fazendo sim. São indivíduos que discutem a implicação das mutações e chegam à conclusão comicamente humanitária e pragmática de que as mutações germinativas são mais importantes que as somáticas porque são transmitidas para gerações futuras (enquanto as somáticas, não).
Será que ninguém mais estudou Napoleão, Hitler, Einstein?
Será que ninguém mais leu “Ilíada” e “Odisséia”, obras de um escritor cego, Homero?
Será que ninguém mais compra CDs de Andrea Bocelli, o cantor que encena, joga xadrez, anda a cavalo e é cego?
Se malformações fossem uma real limitação, existiria na humanidade um compositor surdo?
Refuto as palavras e as prioridades dos “doutores da genética”.
O ser humano é “muito” perante a humanidade, porque ele pode alterar o rumo das civilizações enquanto o seu destino se manifesta.
Embora limitados fisicamente, nossas mentes são livres para explorar o universo até os maus sonhos permitirem. Assim como o físico Stephen Hawking que, mesmo sofrendo de esclerose lateral amiotrófica, tornou-se um ícone da física.
Digo que devemos, sim, dar a devida importância às mutações somáticas porque atingem homens e os descendentes indiretamente. Afinal, a humanidade é composta pelo gênero humano e uma herança é bem mais que um patrimônio econômico-financeiro ou um conjunto de proteínas. São valores da alma.
A questão ética polêmica preocupante está além de abordar o que faremos e/ou usaremos para atingir a perfeição e a imortalidade. Não é também se conseguiremos chegar até lá.
O que preocupa é: qual a graça de uma vida onde as conseqüências podem ser burladas? Como existirá prazer sem dor, vida sem morte? O que faremos com a perfeição? Será que a mente de Hawking seria tão livre, tão brilhante se seu corpo não fosse aprisionado pela doença?
O “Admirável Mundo Novo” vale a pena? Nele não há amor. Segundo Platão, o amor é característica fundamental dos seres imperfeitos, uma vez que consiste no único caminho da perfeição. Caminho em que nos ocupamos em cuidar do próximo, como continuidade de nós mesmos.
Ser humano não é aparentar agradabilidade, é respeitar limitações, é conviver com as diferenças que não são boas nem más, apenas diferenças. Um tratamento humanitário não esconde os sinais, alivia os sintomas; o sucesso médico não consiste em curar as síndromes que “poderiam existir em cada um de nós”, mas em CUIDAR das diferenças que nos causam dor e existem em todos nós.
Mayra Lopes de Almeida Reis.
Publicada em 25/04/2005

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